segunda-feira

Medo

"- Não faças barulho." Pediu-me ela num sussurro. "- Não te quero ouvir mais. Estou farta de ti. Quando voltar a abrir os olhos quero que estejas na outra ponta do mundo." Apontou o dedo magro numa direcção qualquer e fechou os olhos. Eu escondi-me na sala ao lado onde ainda conseguia ouvi-la a cantarolar uma canção de embalar qualquer. O sol já se tinha posto havia dois meses, estava escuro cerrado e um forte cheiro húmido dificultava a respiração. Fiquei quieto a um canto na sala contígua, para onde tinha rastejado. Acho que ela nunca mais abriu os olhos. Antes de eu desaparecer ainda ouvi uma ténue melodia a arrastar-se para o infinito.

2 comentários:

HT disse...

"- Não faças barulho." Pediu-me ela num sussurro. "- Não te quero ouvir mais. Estou farta de ti. Quando voltar a abrir os olhos quero que estejas na outra ponta do mundo." Foi então que lhe coloquei fita isoladora na boca em quantidade suficiente para abafar aquilo que poderia ser um guincho incomodativo aos meus ouvidos. Peguei na faca e desventrei-a muito lentamente ao mesmo tempo que admirava os seus olhos esbogalhados e as pupilas dilatadas. Apontou o dedo magro numa direcção qualquer e fechou os olhos. Fiquei quieto a um canto na sala contígua, para onde tinha rastejado. Acho que ela nunca mais abriu os olhos. Antes de eu desaparecer ainda ouvi um ténue guincho a arrastar-se para o infinito.

- Não faças barulho - Pedi-lhe eu num sussurro.

Miguel disse...

"- Não faças barulho." Pediu-me ela num sussurro. "- Não te quero ouvir mais. Estou farta de ti. Quando voltar a abrir os olhos quero que estejas na outra ponta do mundo." Foi então que acabei de beber a minha jola, pensei que já tinha bebido demais e isso não seria provavelmente o mais saudável. Ela estava de olhos fechados, conseguia sentir a sua embriaguez num bafo quente e de cheiro desagradável que saía da sua boca. O que estava ali a fazer? O que me atraía ali? Cambaleei até uma sala contígua e sentei-me no chão, a ouvir o jazz melancólico que uns gajos com um aspecto mais cool do que eu debitavam arrastadamente. Do outro lado da sala ela gritava um sonoro "filho da puta!" eu comecei a rir descontroladamente, levantei-me e fui queixar-me a um espelho de uma casa de banho qualquer o quão estranha e equívoca pode ser a vida.

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